Oito meses após denúncia do DIA, site continua vendendo abortivo probido via Internet
A morosidade da polícia para combater crimes no âmbito da internet, aliada às facilidades de anonimato em muitos sites hospedeiros mundo afora, vem causando mais vítimas a cada dia. Denunciado há oito meses pelo DIA, o criminoso identificado como Fábio Perrone (nome falso) mudou de endereço eletrônico, hospedou seu site nos EUA e, de sua base em Campinas (SP), continua fazendo propaganda e vendendo o remédio abortivo Citotec, proibido no Brasil desde 2003.
A Delegacia de Repressão a Crimes de Informática (DRCI) remeteu o caso à Polícia Civil de São Paulo em maio, quando O DIA denunciou o crime com exclusividade. Procurada, a instituição paulista informou, através da assessoria de imprensa, que o inquérito está com a Divisão de Saúde Pública do Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania, mas que, por enquanto, não havia mais informações sobre o caso.
“Agora, com essa migração de endereço, vamos oficiar novamente a polícia de São Paulo, mas acredito que eles estejam tendo problemas para encontrá-lo, pois o criminoso paga confidencialidade de dados ao site que o hospeda nos EUA”, explicou o delegado titular da DRCI, Gilson Perdigão.
A especializada do Rio descobriu que o criminoso recebe os pagamentos pela venda do abortivo em uma conta da Caixa Econômica Federal em Criciúma, Santa Catarina.
O DIA simulou interesse nos ‘serviços’ de Perrone e recebeu a ‘bula’ dele, que explica o passo a passo para cometer o crime, além da tabela de custos. O procedimento para mulheres que estão entre 12 e 16 semanas de gestação sai por cerca de R$ 3,5 mil.
Relatos de ‘clientes’ são assustadores
Depoimentos de ‘clientes’, postados no endereço eletrônico criminoso, parecem um roteiro de filme de terror. “Corri para o banheiro e fiquei duas horas com o sangue descendo e pedaços que pareciam um bife de fígado. Espero nunca mais fazer isso na minha vida! Me sinto um monstro nesse momento!”, descreve D.
“O remédio me deu muita tontura, calafrios, diarreia e muita cólica. A dor foi horrível e insuportável. O feto saiu inteiro e já estava formado”, detalha R.
Quem compra não denuncia
Segundo o delegado Gilson Perdigão, da DRCI, a quadrilha que vende Citotec é especializada e possui algumas ramificações.
“Além disso, é pouco provável que se trate de um estelionato, ou seja, prometer vender o medicamento e não entregar. Eles, aparentemente, vendem mesmo o abortivo. É difícil que alguém faça denúncia, pois quem compra também comete crime”.
Quem quiser passar informações que ajudem a polícia pode ligar para o Disque-Denúncia (2253-1177) ou para a a DRCI (2332-8190).
‘PODE HAVER MORTE’, DIZ FLÁVIA DO VALE (Obstetra e ginecologista)
Obstetra e ginecologista, Flávia do Vale é especialista em medicina fetal e coordena as unidades externas do Perinatal, como a do Hospital de Icaraí, em Niterói. Ela sentencia: “Há risco de vida para quem usa Citotec para abortar”.
O DIA - Quais os danos que mulheres que usam esse medicamento desta forma podem sofrer?
Flávia: São vários. A gravidez pode estar fora do útero e isso vai causar sequelas no bebê que são imprevisíveis. O feto não será abortado. Há o risco de má-formação e até de perda do útero.
—Quem faz esse procedimento pode morrer?
—Evidente! A droga não expulsa tudo que está no útero e essas mulheres, em geral, não procuram socorro. Pode haver infecção e esse quadro tende a evoluir para infecção generalizada e morte.
—Está na hora de a sociedade discutir abertamente o aborto e evitar que criminosos enriqueçam com essa tragédia?
—Já passou da hora de tratar o problema como de saúde, e não apenas policial. Campanhas de prevenção à gravidez precisam ser ampliadas, e acho que a legislação atual deve ser discutida.
Fonte: O DIA