Amados irmãos,
seguimos publicando as catequeses do Papa Bento XVI sobre grandes teólogos, por muitos de nós desconhecidos. A riqueza da Igreja pode ser vista também nos seus pensadores, que com espírito de fé e decididos pela verdade, buscaram dar razão a Revelação Divina. Fazer teologia é também fazer caridade, pois para amar mais a Deus é preciso sempre buscar conhecê-lo melhor.
Ruperto de Deutz
Queridos irmãos e irmãs!
Hoje vamos conhecer outro monge beneditino do século XII. O seu nome é Rupert de Deutz, uma cidade situada perto de Colónia, sede de um famoso mosteiro. O próprio Rupert fala da própria vida numa das suas obras mais importantes, intitulada A glória e a honra do Filho do homem, que é um comentário parcial ao Evangelho de Mateus. Ainda criança, ele foi acolhido como "oblato" no mosteiro beneditino de São Lourenço em Liège, segundo o costume da época de confiar um dos filhos à educação dos monges, pretendendo fazer dele um dom a Deus. Rupert amou sempre a vida monástica. Aprendeu muito depressa a língua latina para estudar a Bíblia e para beneficiar das celebrações litúrgicas. Distinguiu-se pela integérrima rectidão moral e pela forte afeição à Sé de São Pedro.
Os seus tempos eram marcados por contrastes entre o Papado e o Império, devidos à chamada "luta das investiduras", com a qual – como mencionei noutras Catequeses – o Papado queria impedir que a nomeação dos Bispos e a prática da sua jurisdição dependessem das autoridades civis, que eram guiadas sobretudo por motivações políticas e económicas, certamente não pastorais. O Bispo de Liège, Otberto, resistia às directrizes do Papa e mandou para o exílio Berengário, abade do mosteiro de São Lourenço, precisamente devido à sua fidelidade ao Pontífice. Neste mosteiro vivia Rupert, o qual não hesitou em seguir o seu Abade no exílio e só quando o Bispo Otberto voltou à comunhão com o Papa regressou a Liège e aceitou tornar-se sacerdote. Até àquele momento, de facto, tinha evitado receber a ordenação sacerdotal de um Bispo em dissenso com o Papa. Rupert ensina-nos que quando surgem controvérsias na Igreja, a referência ao ministério petrino garante fidelidade à sã doutrina e confere serenidade e liberdade interior. Depois da disputa com Otberto, ele teve que abandonar o seu mosteiro mais duas vezes. Não obstante tenha sido absolvido de todas as acusações, Rupert preferiu passar um pouco de tempo em Siegburg, mas dado que as polémicas ainda não tinham cessado quando regressou ao mosteiro de Liège, decidiu estabelecer-se definitivamente na Alemanha. Nomeado abade de Deutz em 1120, ali permaneceu até 1129, ano da sua morte. Deixou o mosteiro só para uma peregrinação a Roma, em 1124.
Escritor fecundo, Rupert deixou numerosíssimas obras, ainda hoje de grande interesse, também porque foi activo em vários e importantes debates teológicos da época. Por exemplo, interveio com determinação na controvérsia eucarística, que em 1077 levara à condenação de Berengário de Tours. Ele tinha feito uma interpretação redutiva da presença de Cristo no Sacramento da Eucaristia, definindo-a apenas simbólica. Na linguagem da Igreja ainda não tinha entrado o termo "transubstanciação", mas Rupert, empregando por vezes expressões audaciosas, fez-se decidido defensor do realismo eucarístico e, sobretudo numa obra intitulada De divinis officcis (Os ofícios divinos), afirmou com determinação a continuidade entre o Corpo do Verbo encarnado de Cristo e o presente nas Espécies eucarísticas do pão e do vinho. Queridos irmãos e irmãs, parece-me que a este ponto devemos pensar inclusive no nosso tempo; existe também hoje o perigo de reduzir o realismo eucarístico, isto é, de considerar a Eucaristia quase como apenas um rito de comunhão, de socialização, esquecendo com muita facilidade que na Eucaristia está realmente presente Cristo ressuscitado – com o seu corpo ressuscitado – o qual se entrega às nossas mãos para nos tirar de nós mesmos, incorporando-nos no seu corpo imortal e para nos guiar assim para a vida nova. Este grande mistério que o Senhor está presente em toda a sua realidade nas Espécies eucarísticas é um mistério que se deve adorar e amar sempre de novo! Gostaria de citar aqui as palavras do Catecismo da Igreja Católica que têm em si o fruto da meditação da fé e da reflexão teológica de dois mil anos: "O modo da presença de Cristo sob as Espécies eucarísticas é único... No santíssimo sacramento da Eucaristia estão contidos verdadeira, real e substancialmente, o Corpo e o Sangue, conjuntamente com a alma e a divindade de nosso Senhor Jesus Cristo e, por conseguinte, o Cristo total: Deus e homem" (n. 1374). Também Rupert contribuiu, com as suas reflexões, para esta precisa formulação.
Outra controvérsia, na qual o abade de Deutz foi envolvido, refere-se ao problema da conciliação da bondade e da omnipotência de Deus com a existência do mal. Se Deus é omnipotente e bom, como se explica a realidade do mal? De facto, Rupert reagiu à posição tomada pelos mestres da escola teológica de Laon, que com uma série de raciocínios filosóficos distinguiam na vontade de Deus a "aprovação" e a "permissão", concluindo que Deus permite o mal sem o aprovar e, portanto, sem o querer. Rupert, ao contrário, renuncia ao uso da filosofia, que considera simplesmente fiel à narração bíblica. Ele parte da bondade de Deus, da verdade que Deus é sumamente bom e não pode deixar de querer o bem. Assim, indica a origem do mal no próprio homem e no uso errado da liberdade humana. Quando Rupert enfrenta este tema, escreve páginas cheias de inspiração religiosa para louvar a misericórdia infinita do Pai, a paciência e a benevolência de Deus para com o pecador.
Como outros teólogos da Idade Média, também Rupert se perguntava: por que o Verbo de Deus, o Filho de Deus, se fez homem? Alguns, muitos, respondiam explicando a encarnação do Verbo com a urgência de reparar os pecados do homem. Ao contrário, Rupert, com uma visão cristocêntrica da história da salvação, alarga a perspectiva, e numa sua obra intitulada A glorificação da Trindade defende a posição que a Encarnação, acontecimento central de toda a história, tinha sido prevista desde a eternidade, também independentemente do pecado do homem, para que toda a criação pudesse louvar a Deus Pai e amá-lo como uma única família reunida em volta de Cristo, Filho de Deus. Então ele vê na mulher grávida do Apocalipse toda a história da humanidade, que está orientada para Cristo, assim como a concepção visa o parto, uma perspectiva que será desenvolvida por outros pensadores e valorizada também pela teologia contemporânea, a qual afirma que toda a história do mundo e da humanidade é concepção orientada para o parto de Cristo. Cristo está sempre no centro das explicações exegéticas fornecidas por Rupert nos seus comentários aos Livros da Bíblia, aos quais se dedicou com grande diligência e paixão. Ele reencontra assim a unidade admirável em todos os acontecimentos da história da salvação, da criação à consumação final dos tempos: "Toda a Escritura", afirma ele, "é um só livro, que tende para a mesma finalidade [o Verbo divino]; que vem de um só Deus e foi escrito por um só Espírito" (De glorificatione Trinitatis et processione Sancti Spiritus I, V PL 169, 18).
Na interpretação da Bíblia, Rupert não se limita a repetir o ensinamento dos Padres, mas mostra uma sua originalidade. Ele, por exemplo, é o primeiro escritor que identificou a esposa do Cântico dos Cânticos com Maria santíssima. Assim o seu comentário a este livro da Escritura revela-se uma espécie de summa mariológica, na qual estão presentes os privilégios e as excelentes virtudes de Maria. Num dos trechos mais inspirados do seu comentário Rupert escreve: "Ó dilectíssima entre as dilectas, Virgem das virgens, o que louva em ti o teu Filho dilecto, que todo o coro dos anjos exalta? São louvados a simplicidade, a pureza, a inocência, a doutrina, o pudor, a humildade, a integridade da mente e da carne, ou seja, a virgindade incorrupta" (In Canticum Canticorum 4, 1-6, ccl 26, pp. 69-70). A interpretação mariana do Cântico de Rupert é um óptimo exemplo da sintonia entre liturgia e teologia. De facto, vários trechos deste Livro bíblico já eram usados nas celebrações litúrgicas das festas marianas.
Além disso, Rupert ocupou-se da inserção da sua doutrina mariológica na eclesiológica. Por outras palavras, ele vê em Maria Santíssima a parte mais santa da Igreja inteira. Eis por que o meu venerado predecessor, Papa Paulo VI, no discurso de encerramento da terceira sessão do Concílio Vaticano II, ao proclamar solenemente Maria Mãe da Igreja, citou precisamente uma proposição tirada das obras de Rupert, que define Maria portio maxima, portio optima a parte mais excelsa, a melhor parte da Igreja (cf. In Apocalypsem 1.7, PL 169, 1043).
Queridos amigos, destas rápidas menções apercebemo-nos de que Rupert foi um teólogo fervoroso, dotado de grande profundidade. Como todos os representantes da teologia monástica, ele soube conjugar o estudo racional dos mistérios da fé com a oração e com a contemplação, considerada o vértice de qualquer conhecimento de Deus. Ele mesmo fala algumas vezes das suas experiências místicas, como quando confia a alegria inefável de ter sentido a presença do Senhor: "Naquele breve momento – afirma ele – experimentei quanto é verdadeiro o que Ele mesmo diz: Aprendei de mim que sou manso e humilde de coração" (De gloria et honore Filii hominis. Super Matthaeum 12, PL 168, 1601). Também nós podemos, cada um a seu modo, encontrar o Senhor Jesus, que incessantemente acompanha o nosso caminho, se torna presente no Pão eucarístico e na sua Palavra para a nossa salvação.