Por Paulo Gustavo Gonet Branco e Paulo Vasconcelos Jacobina
Primeira parte – A colocação do problema.
Paulo Vasconcelos Jacobina
1. Introdução.
O problema da atenção religiosa a pessoa internada em estabelecimento sanitário tem sido negligenciado na doutrina jurídica, apesar de se constituir num problema com uma profunda dimensão humana e jurídica, e que suscita dúvidas, angústias e dores muito reais todos os dias, nos hospitais, clínicas e outros estabelecimentos de saúde nos quais se encontrem pessoas privadas ou diminuídas em sua capacidade de deambular livremente e, ao mesmo tempo, privadas ou restringidas na sua possibilidade de encontrar aquele conforto espiritual que, segunda a própria Organização Mundial de Saúde, colabora com o processo de restabelecimento da saúde dos pacientes.
Os problemas práticos surgem de todos os lados. Muitas vezes são os profissionais dessas entidades que se queixam da falta de disciplina por parte de ministros religiosos, que turbam o ambiente de tranquilidade com ritos muitas vezes barulhentos e incômodos, ou que, aproveitando-se da facilidade de acesso e da fragilidade dos internos, dedicam-se a um proselitismo indigno, ou que, ainda, pela ignorância ou recusa dos métodos de assepsia e higiene pessoal, favorecem o contágio entre os internos, tocando a uns e a outros sem os cuidados mínimos e tornando-se vetor de contaminação e proliferação de patologias.
Por outro lado, muitas vezes os ministros religiosos queixam-se da intolerância dos profissionais e dos dirigentes destas entidades que, movidos por preconceitos religiosos ou por um laicismo nefasto, abusam de sua autoridade para negar acesso ao paciente, privando-o do conforto a que têm pleno direito ou retardando-o de modo a inviabilizar, na prática, tal acesso. De fato, reter ou retardar por horas um acesso pode significar, por um lado, o rompimento do tênue fio da vida de um paciente agonizante, esvaziando a ação do religioso, e, por outro, a inviabilização prática do acesso, em razão das demandas do próprio ministro com outros fiéis.
O presente artigo tem o objetivo, portanto, de aprofundar o debate, partindo de uma discussão de cunho mais jurídico-filosófico, na sua primeira parte, até abordar concretamente o problema do direito positivo brasileiro, na segunda parte.